Dia 1
A chegada ao espaço foi bastante acolhedora. Na
distância a que se encontram os muros da Casa do Sol do resto da cidade tudo se
materializa em silêncio, mas um silêncio vivo nos passos dos cachorros, na
cozinha em movimento, na história que não pára de se recontar na minha mente.
Lembro-me de quando era mais jovem e vi uma foto da emblemática parede repleta
de fotografias dos grandes ídolos de Hilda Hilst, e escrevo gora, com a
distância de apenas um dia do momento em que estive pela primeira vez em frente
a essa parede sendo fitado pelo talhos de luz e sombra de Kafka e Wittgenstein
em seus quadros emoldurados.
No primeiro contato surgiu a marca do que queríamos
propor, pensar o Deus de Hilda, ou seria mais próprio dizer os deuses que
habitam a voz literária dela. Pensar esse sagrado que simultaneamente é
abandono e presença, segurança e castigo. Acionar as imagens hierografadas nos
nomes que Hilst deu ao Deus, e inventariar tantos outros mais, obscenos,
grotescos, esquecidos.
Pela manhã chuva. Inventariamos os mais de trinta
nomes de Deus na obra de Hilda e propusemos uma imagem para cada uma delas a
partir dos elementos da paisagem, dos espaços e dos fluxos que compõem a Casa
do Sol. Os cachorros, sempre os grandes senhores da Casa, carinhosamente deitaram-se
na nossa mesa e nos acompanharam na cartografia desse primeiro instante.
Nesse entre-tempo dos minutos dilatados e espaçados
que contam o passar das horas na Casa do Sol, começamos a leitura de O Sagrado e o Profano, de Mircea Eliade,
e de El Museo Hermético – Alquimia e
Mística, de Alexander Roob, ambos sugeridos por Jurandy,
guia/guardião/companheiro do Instituto Hilda Hilst.
Da manhã uma frase de James Joyce em Finnegans Wake ficou ecoando pelo resto
do dia, encerro com ela: “Let us leave theories there and return to here’s
here. Now hear.”
Nenhum comentário:
Postar um comentário