Dia 5
“Calma, tudo não é assim, escuridão e morte”.
Hilda Hilst, Fluxo.
Tao dos labirintos. Caminho que
questiona a si mesmo. Se ser, si ser. Os movimentos da escrita de Hilda lapidam
com golpes de um pendulo irrefreável a possibilidade de um Deus, de muitos
deuses, que também são maldade, que com, ou sem, seus politeísticos panteões
resguardam em sua carne ausente e suspeita aquilo que há em nós que causa nojo
a nós mesmos.
Nas
biografias de santos na biblioteca pessoal dela, nos diversos símbolos de
tantas religiões que coabitam as mesas da sala da casa dela, nos símbolos
místicos espalhados pela casa, uma pergunta no oco, a pergunta da hipótese de
Deus, ou um deus, assim minúsculo, ou ainda de um deus-Lázaro, morto que há de
voltar. E no oco o eco que constrói os labirintos sobrepostos de Fluxo-Floema, Qadós, Lázaro, O Unicórnio, O Oco e Um Cálido In Extremis.
Acordamos
nesse dia com um grito de sol que salta a janela, e de armas na mão nos assalta
do sono e nos joga na direção de um dia intenso de trabalho. Saímos para
diversas paisagens dessa carne flutuante da Casa do Sol, pela palha e capim,
mármore e madeira, folhas secas e espinhos encarnados, galhos gigantes e odes
mínimas feitas de pedra. Com elas damos vida a novas pétalas de carne, gritamos
ao vento outros nomes de deuses, Cão de Pedra, Grande Corpo Rajado, Grande
Perseguidor, O Incognoscível, Cadela de Pedra, Construtor do Mundo, Sumidouro,
O Isso, O Mudo Sempre, O Semeador.
Imagens
de carne corroída, e escavadas até o osso... mas, que osso? Buraco de todas as
coisas, caímos em nós mesmos olhando além, e nos quebramos em mil pedaços
gelatinosos, sem osso de coisa sólida, só a passagem do tempo que corrói.
Durante
a noite participamos de um sarau na Casa do Sol, um sarau para Hilda após a lua
sanguínea, vermelha da madrugada desse dia. Lemos trechos de Qadós e Floema, ouvimos outros, de Obscena
Senhora D., Poemas Malditos, Gozosos
e Devotos, Bufólicas, Contos D’Escárnio, entre tantos outros, debaixo de um
céu limpo e estrelado, que antecipadamente celebrava o aniversário de Hilda,
ainda viva, figueira de coisas que ainda descobriremos junto dela.
Assim
se foi esse dia, assim vem o outro. Com nossos olhos de cão passeamos para a
metade final de nossa passagem aqui.
Nenhum comentário:
Postar um comentário